03 abril, 2020

O "CISNE NEGRO" DE 2020?

NOTA DO TRADUTOR: Segue abaixo texto interessante escrito pelo professor Roberto de Mattei. Ressalvamos, por outro lado, que o articulista deve ser observado com cautela, uma vez que é filiado  à corrente de pensamento esposada por Plínio Correia de Oliveira, que já foi fartamente denunciada pelo professor Orlando Fedeli, principalmente no seu livro: A gnose burlesca dos Arautos do Evangelho. O texto abaixo, no entanto, faz uma singular interpretação dos fatos correntes provocado pelo "misterioso vírus".

Link do livro do prof. Orlando: http://www.montfort.org.br:84/bra/veritas/religiao/contra-pco/


O cisne negro (Cygnus atratus) é um pássaro raro, originário da Austrália, que tem esse nome devido à coloração de sua plumagem. Nassim Nicholas Taleb, um analista financeiro, ex-trader de Wall Street, no seu livro O cisne negro (The Black Swan: The Impact f the Highly Improbable, Random House, New York 2007), utilizou esta metáfora para explicar a existência de eventos inesperados e catastróficos que poderiam mudar a vida de todo mundo.

O coronavírus tem sido o cisne negro de 2020, escreve Marta Dassú, do Instituto Aspen, explicando que a epidemia está colocando em crise a atividade econômica das nações ocidentais e “demonstra a fragilidade das cadeias produtivas globais; quando um choque atinge um dos anéis, o impacto se torna sistêmico” (Aspenia, 88 (2020), p.9). “A segunda epidemia está a caminho – escreve Frederico Rampini no La Repubblica de 22 de março – e todos precisam enfrentar e curá-la. Ela se chama Grande Depressão e terá um balanço de vítimas paralelo ao do vírus. Na América ninguém mais usa o termo recessão porque é muito brando.


A economia interconectada do mundo se revela como um sistema precário, mas o impacto do coronavírus não diz respeito apenas a um aspecto econômica e sanitário, mas também religioso e ideológico. A utopia da globalização, que até setembro de 2019 parecia triunfar, sofre agora uma débacle irremediável.  Em 12 de setembro de 2019 o Papa Francisco tinha convidado os líderes das principais religiões, além dos expoentes internacionais do universo econômico, político e cultural, para participarem de um evento solene que seria no Vaticano no dia 14 de maio de 2020: O Global Compact on Education, o pacto educativo global. Nesta mesma época a “profetiza” da ecologia profunda, Greta Thunberg, chegava em Nova York para o Climate Change Summit 2019 organizado pela ONU e aos participantes do evento, Papa Francisco, na vigília do Sínodo da Amazônia, enviava um vídeo-mensagem para manifestar sua total consonância com os objetivos globalistas.

No dia 21 de janeiro de 2020 o Papa Francisco endereçou uma mensagem a Klaus Schwab, presidente executivo do World Economic Forum (WEF), de Davos, sublinhando a importância de uma “ecologia integral”, que levasse em conta “a complexidade e a interconexão da nossa casa comum”. Mas um misterioso vírus já começava a infligir um tiro mortal na “aldeia global”.

Poucos meses depois, nos encontraríamos diante de uma situação absolutamente inédita. Greta é esquecida, o Sínodo da Amazônia falhou, os líderes políticos do mundo revelaram a incapacidade em afrontar a emergência, o Global Compact é esquecido, a praça São Pedro, centro espiritual do mundo, está vazia. As autoridades eclesiásticas se conformam (às vezes se antecipando) aos decretos restritivos das autoridades civis que vetavam as missas e as cerimônias religiosas de todos os tipos. O evento mais simbólico e paradoxal seja talvez o fechamento do Santuário de Lourdes, o lugar por excelência para as curas espirituais e físicas, que fechou as portas, movido pelo temor de que alguma pessoa possa adoecer ao pedir a Deus por sua saúde. Isso tudo é uma manobra? Nos encontramos diante de um poder totalitário que restringe a liberdade dos cidadãos e persegue os cristãos?

É estranho haver uma perseguição onde parece ausente toda forma  heroica de resistência, até o martírio da parte dos perseguidos, muito diferente de todas as grandes perseguições da história. Na realidade, não se deverá falar de perseguição anticristã, mas “autoperseguição” por parte dos homens da Igreja, que fechando as igrejas e suspendendo as missas, parecem portar o último ponto coerente de um processo de autodemolição iniciado nos anos sessenta do século passado com o Concílio Vaticano II. E infelizmente, tirante algumas raras exceções, até mesmo o clero tradicionalista, que ficou fechado em suas casas, parece vítima dessa autoperseguição.

Foi comovente a generosidade de 8000 médicos italianos ao responderem ao apelo do governo que convocava 300 voluntários nos hospitais da Lombardia. Como teria sido edificante um apelo aos sacerdotes pelo presidente da Conferência episcopal para evitar faltar aos fiéis os sacramentos nas igrejas, nas casas, nos hospitais! Ainda vale lembrar a mensagem de Fátima, que no ano de 2017 se comemorou o centésimo ano da aparição. No dia 25 de março, o cardeal António Augusto dos Santos Marto, bispo de Leiria-Fátima, renovou a cerimônia de consagração ao Imaculado Coração de Maria para toda península Ibérica. Foi um ato meritório, mas Nossa Senhora pediu uma coisa a mais: a consagração específica da Rússia, feita pelo Papa, em união com todos os bispos do mundo. É este o ato - até agora nunca realizado - que todo mundo espera, antes que seja tarde demais.

Nossa Senhora de Fátima anunciou que se o mundo não se converter diversas nações serão aniquiladas. Quais serão essas nações? E quais os modos de aniquilamento? O que é certo é que o principal castigo não é a destruição dos corpos, mas a destruição das almas. Nas Sagradas Escrituras se lê que “cada qual será punido por meio das coisas com as quais peca” (Sabedoria 11,16). O mesmo pensamento pagão, pela boca de Sêneca, que recorda que “o castigo do delito está no delito mesmo”. (Da fortuna, parte II, cap. 3).

A punição começa quando se perde o conceito de um Deus justo e remunerador, e por afiliar-se a uma falsa imagem de um Deus que, como dito pelo Papa Francisco, “não permite tragédias para punir os pecados” (Angelus, 28 de fevereiro 2020). “Como frequentemente pensamos que Deus é bom se nós agimos bem e que nos castiga, se nós agimos mal. Não é assim,” reiterou Francisco na missa de Natal no último 25 de dezembro. Por outo lado, até mesmo o “Papa bom”, João XXIII, recordava que “o homem, que dissemina o pecado, colhe o castigo. O castigo de Deus é a resposta devido os pecados dos homens”; portanto “Ele (Jesus) nos chama para fugir do pecado, causa principal dos grandes castigos” (Rádio mensagem de 28 de dezembro de 1958).

Remover a ideia do castigo não significa evitá-lo. O castigo é a consequência do pecado e somente a contrição e a penitência dos próprios pecados podem evitar a pena que estes pecados inevitavelmente trazem, por ter violado a ordem do universo. Quando os pecados são coletivos, os castigos são coletivos. Como admirar-se pelo morticínio que acomete uma nação, quando os governos são culpados de leis homicidas como o aborto, e mesmo durante a epidemia o massacre dos inocentes continua, como na Grã Bretanha, onde o governo autorizou o aborto em casa para não ter que interromper a carnificina durante o coronavírus. E quando, no lugar dos corpos, as almas são afetadas, como se admirar que a perda da fé seja a punição para os responsáveis? Não enxergar a mão de Deus por trás desta grande catástrofe da história é um sintoma de falta de fé.

O castigo coletivo chegou de repente, como um “cisne negro” que apareceu rapidamente sobra as águas. Esta visão nos confunde e não sabemos explicar de onde vem e que coisa anuncia. O homem é incapaz de prever os “cisnes negros” que de um dia para o outro põe sua vida de avesso. Mas estes acontecimentos não são frutos do acaso, como sustenta o senhor Taleb e todos os que analisam os eventos em uma perspectiva humana e secularista, esquecendo que o acaso não existe e que as maquinações dos homens estão sempre sujeitas à vontade de Deus. Tudo depende de Deus e Deus guia todas as coisas para uma finalidade quando inicia seu trabalho: “Pois Ele é único: quem poderá repeli-lo? O que for do Seu desejo, Ele fará”. (Jó, 23,13).



Roberto de Mattei
Corrispondenza Romana, 25 de março de 2020.

Fonte: https://www.corrispondenzaromana.it/il-cigno-nero-del-2020/